13 de agosto de 2015

Oito coisas que aprendi com a educação na Finlândia

Por BBC – IG Educação – 12/08/2015 – São Paulo, SP

Dona de um dos sistemas de ensino mais elogiados do mundo, a Finlândia recebeu, de fevereiro a julho deste ano, 35 professores de institutos federais brasileiros para treinamento e capacitação.

Embora em 2012 o país nórdico tenha caído do topo para a 12ª posição do Pisa, o principal exame internacional de educação (o Brasil ficou na 58ª posição do ranking, entre 65 países), ele ainda é apontado pela OCDE – a entidade que aplica o Pisa – como `um dos líderes mundiais em performance acadêmica`, e se destaca pela igualdade na educação, alta qualificação de professores e por constantemente repensar seu currículo escolar.

Os docentes brasileiros foram selecionados pelo programa Professores para o Futuro, do CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ministério da Educação), para passar cinco meses estudando a educação finlandesa.

A BBC Brasil conversou com quatro desses professores, para conhecer o que viram na Finlândia e saber se lições trazidas de lá podem facilitar seu trabalho em sala de aula e melhorar o aprendizado nas instituições públicas de ensino onde atuam. Apesar das diferenças com o sistema brasileiro, os professores disseram ver como `pequenas revoluções` o que podem agregar do ensino finlandês em suas rotinas.

`Vou começar com um trabalho de formiguinha, mostrando aos meus colegas o que aprendi, gravando minhas aulas e adaptando (as metodologias) à nossa realidade e aos nossos estudantes`, diz a professora Giani Barwald Bohm, do Instituto Federal Sul-rio-grandense.

Os 25 institutos federais que enviaram professores ao país nórdico reúnem cursos de ensino médio, profissional e superior com ênfase em ciência e tecnologia.

Veja o que os professores aprenderam na Finlândia:

1. Usar mais projetos nas aulas

Os professores entrevistados pela BBC Brasil dizem que projetos elaborados por alunos e a resolução de problemas estão ganhando protagonismo no ensino finlandês, em detrimento da aula tradicional.

São as metodologias chamadas de `problem-based learning` e `project-based learning` (ensino baseado em problemas ou projetos). Neles, problemas – fictícios ou reais da comunidade – são o ponto de partida do aprendizado. Os alunos aprendem na prática e buscam eles mesmos as soluções.

`Os projetos são desenvolvidos sem o envolvimento tão direto do professor, em que os alunos aprendem não só o conteúdo, mas a gerir um plano e lidar com erros`, diz Bruno Garcês, professor de Química do Instituto Federal do Mato Grosso, que pretende aplicar o método em aulas de experimentos práticos.

Os professores brasileiros visitaram, na Finlândia, cursos superiores baseados inteiramente nessa metodologia. `Um curso de Administração tem disciplinas tradicionais no primeiro ano. Mas, nos dois anos e meio seguintes, os alunos deixam de ter professores, passam a ter tutores, formam empresas reais e aprendem enquanto desenvolvem o negócio`, diz Francisco Fechine, coordenador do Instituto Federal de Tecnologia da Paraíba.

Não é uma estrutura que sirva para qualquer tipo de curso, mas funciona nos voltados, por exemplo, a empreendedorismo, explica Joelma Kremer, do Instituto Federal de Santa Catarina. `E os alunos têm uma carga de leitura, para buscar (nos livros) as ferramentas que precisam para resolver os problemas.`

2. Foco na produção de conteúdo pelos alunos

A resolução de problemas e projetos é parte de um ensino mais centrado na produção do próprio aluno. Ao professor cabe mediar a interação na sala de aula e saber quais metas têm de ser alcançadas em cada projeto. `Nós (no Brasil) somos mais centrados em o professor preparar a aula, dar e corrigir exercícios. O aluno faz pouco. Podemos dar mais espaço para o aluno avaliar o que ele vai desenvolvendo`, diz a professora Giani Barwald Bohm, do Instituto Federal Sul-rio-grandense.

`No modelo tradicional de ensino, quem mais aprende é o professor. Lá (na Finlândia) é o aluno quem tem de buscar conteúdo, e o professor tem que saber qual o objetivo da aula. Para isso você não precisa de muita tecnologia, mas sim de capacitação (dos docentes)`, agrega Joelma Kremer

3. Repensar o papel da avaliação

Nesse contexto, a avaliação tem utilidade diferente, diz Kremer: `A avaliação está presente, mas os alunos se autoavaliam, avaliam uns aos outros, e o professor avalia os resultados dos projetos`.

`Ao reduzir o número de testes (formais) e avaliar mais trabalhos em grupo e atividades diferentes, os professores têm um filme do desempenho do aluno, e não apenas a foto (do momento da prova)`, diz Fechine.

`Conhecemos um professor de física finlandês que avaliava seus alunos pelos vídeos que eles gravavam dos experimentos feitos em casa e mandavam por e-mail ou Dropbox.`

4. Usar tecnologia e até a mobília para ajudar o professor

A tecnologia não é parte central desse processo, mas auxilia o trabalho do professor em estimular a participação dos alunos finlandeses.

`Em vez de proibir o celular, os professores os usam em sala de aula para estimular a participação dos alunos – por exemplo, respondendo (via aplicativos especiais) enquetes que tivessem a ver com as aulas`, conta Kremer. `Isso torna a aula mais interessante para eles. E é complicado para a gente ficar dizendo, `desliga o celular`, algo que já começa estabelecendo uma relação de antipatia com o aluno.`

Os professores brasileiros também conheceram algumas salas de aula com mobília especialmente projetada, diferente do modelo tradicional de cadeiras individuais voltadas à lousa. `Muitas salas têm sofás, poltronas, mesas ajustáveis para trabalhos individuais ou em grupo e vários projetores`, agrega Kremer. `É um mobiliário pensado para essa metodologia diferente de ensino.`

Fechine vai reproduzir parcialmente a ideia no Instituto Federal da Paraíba, trocando as carteiras de braço por mesas que possam ser agrupadas para trabalhos.

5. Desenvolvimento de habilidades do século 21

A professora Giani Barwald Bohm conta que o ensino fundamental finlandês continua dividido em disciplinas tradicionais, mas focado cada vez mais no desenvolvimento de habilidades dos alunos, e não apenas na assimilação de conteúdo tradicional. `(São desenvolvidas) competências do século 21, como comunicação, pensamento crítico e empreendedorismo`, diz ela.

Para Fechine, estimular a independência do estudante é uma forma de romper o ciclo de `alunos passivos, que só fazem a tarefa se o professor cobrar, interagem muito pouco`.

6. Intervalos mais frequentes entre as aulas

A Finlândia adota aulas de 45 minutos seguidas de 15 minutos de intervalo na educação básica – prática que Bruno Garcês acha que poderia ser disseminada por aqui. `Tira a tensão de ficar tantas horas sentado`, diz.

Fechine também considera a ideia interessante, mas aponta que a grande carga horária no ensino médio brasileiro dificulta sua aplicação e lembra que na Finlândia ela é acompanhada de uma forte cultura de pontualidade. `As aulas começam no horário e aluno rapidamente entra na (rotina de) resolução de problemas.`

7. Cultivar elos com a vida real e empresas

Muitos dos projetos dos estudantes finlandeses são tocados em parcerias com empresas, para aumentar sua conexão com a vida real e o mercado de trabalho, algo que Garcês acha que poderia ser mais frequente no Brasil. `Aqui na área rural do Mato Grosso podemos ter uma interação maior com as fazendas locais, ministrando aulas a partir do que os produtores rurais precisam.`

A vantagem disso é que o aluno vê sentido prático e profissional no que está aprendendo, explica Giani Barwald Bohm. `Ele desenvolve algo diretamente para o mercado de trabalho, que vai ter relevância para o próprio estudante e é contextualizado com as empresas locais.`

Ela destaca também as competições de habilidades práticas desenvolvidas por escolas locais (um preparativo para a competição internacional WorldSkills, que neste ano será realizada em São Paulo, pelo Senai, entre quarta e sábado desta semana). `As empresas são envolvidas na organização e acompanham os alunos no dia a dia e até ficam de olho para contratá-los depois.`

8. Formação mais prática e valorização do professor

A formação dos professores é apontada como a principal chave do sucesso do ensino finlandês. Os brasileiros observaram lá uma capacitação mais prática, voltada ao dia a dia da sala de aula, e mais interação entre o corpo docente. `Algumas salas têm dois professores – um como ouvinte do outro caso seja menos experiente`, relata Fechine.

`Há uma relação mais direta (entre os professores), com muita conversa entre quem dirige o ensino e quem dá aula`, agrega Barwald Bohm. `Além disso, há uma valorização cultural do professor lá, semelhante à de outras profissões. O salário é equivalente e as condições de trabalho dão bastante tempo para o planejamento das aulas`, diz Bruno Garcês.

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