27 de fevereiro de 2009

Ensino Médio, um problema insolúvel?

 

Revisitando as páginas de “A Construção do Pensamento e da Linguagem”, de L. S. Vigotski (São Paulo, Editora Martins Fontes, 2001), três marcantes parágrafos chamaram-me a atenção. São dois parágrafos curtos e outro um pouco mais longo. A ver:

 

O pensador - Auguste Rodin

O pensador - Auguste Rodin

1. “(…) onde o meio não cria os problemas correspondentes, não apresenta novas exigências, não motiva nem estimula com novos objetivos o desenvolvimento do intelecto, o pensamento do adolescente não desenvolve todas as potencialidades que efetivamente contém, não atinge as formas superiores ou chega a elas com extremo atraso” (p. 171).

 

2. “A formação de conceitos surge sempre no processo de solução de algum problema que se coloca para o pensamento do adolescente. Só como resultado da solução desse problema surge o conceito” (p. 237).

 

3. Não menos que a investigação teórica, a experiência pedagógica nos ensina que o ensino direto de conceitos sempre se mostra impossível e pedagogicamente estéril. O professor que envereda por esse caminho costuma não conseguir senão uma assimilação vazia de palavras, um verbalismo puro e simples que estimula e imita a existência dos respectivos conceitos na criança mas, na prática, esconde o vazio. Em tais casos, a criança não assimila o conceito mas a palavra, capta mais de memória que de pensamento e sente-se impotente diante de qualquer tentativa de emprego consciente do conhecimento assimilado. No fundo, esse método de ensino de conceitos é a falha principal do rejeitado método puramente escolástico de ensino, que substitui a apreensão do conhecimento vivo pela apreensão de esquemas verbais mortos e vazios” (p. 247).

 

Vigotski diz que o método puramente escolástico de ensino é rejeitado. Não no Brasil. Aqui é a prática pedagógica corrente, principalmente na escola pública e no Ensino Médio. Dos dois primeiros parágrafos, podemos concluir que estamos impedindo a nossa juventude de desenvolver todas as suas potencialidades e de atingir ou chegar muito atrasada às formas superiores de pensamento. Estamos emburrecendo a nossa juventude.

 

A crítica e a constatação não são novas. O que surprende é a tremenda força de resistência à mudança de nossa escola. Convivo com os problemas da educação brasileira há quarenta anos. Repassando esse tempo todo, resta a sensação de que nada mudou.

 

A invencível resistência à mudança de nossa escola, me fez lembrar um poema de João Cabral de Melo Neto: “O Número Quatro”. Ele diz:

 

O número quatro feito coisa

ou a coisa pelo quatro quadrada,

seja espaço, quadrúpede, mesa,

está racional em suas patas;

está plantada, à margem e acima

de tudo o que tentar abalá-la,

imóvel ao vento, terremotos,

no mar maré ou no mar ressaca.

Só o tempo que ama o ímpar instável

pode contra essa coisa ao passá-la:

mas a roda, criatura do tempo,

é uma coisa em quatro, desgastada.


João Cabral de Melo Neto, O Número Quatro. In: João Cabral, Museu de Tudo. Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1976, p.54.

Inspirado no poema, me propus a identificar as quatro causas fundamentais que fazem com que o Ensino Médio esteja “plantado à margem e acima de tudo o que tentar abalá-lo”. Depois de talvez ainda insuficiente reflexão, escolhi quatro grandes pilares de manutenção de nosso “quadrado” Ensino Médio: o currículo (dividido em disciplinas), o sistema de formação de professores, a facilidade de operação administrativa,  o pensamento pedagógico dominante.

 

Esses quatro pilares estão intimamente relacionados. Eles se reforçam mutuamente criando o espaço, a mesa, o quadrúpede do nosso Ensino Médio. Eles não atendem às necessidades de desenvolvimento intelectual e afetivo de nossos adolescentes. Eles atendem a uma racionalidade dominante. Em uma sequência de artigos posteriores vamos abordar cada um desses pilares e as interrelações entre eles. Se fôlego sobrar, vamos discutir como desgastá-los, rumo à roda da mudança e da melhoria contínua.

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1 comentário

  1. Olá
    Meu nome é Terezinha tenho 54 anos, querob terninar o ensino medio só faltam cinco matérias,português,matemático,inglês,física e química.
    O que devo fazer?
    Obrigada

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