20 de fevereiro de 2014

Estado do Rio cria 24 escolas de ensino médio integrais a partir de parcerias

Críticos, no entanto, veem elitização, já que unidades tendem a receber mais investimentos que as outras

 

Desde o início do ano letivo na rede estadual, os alunos do Ciep Leonel de Moura Brizola, em Niterói, podem começar as aulas tanto com um bom dia, quanto com um bonjour. Com o apoio da Embaixada da França, o colégio é um dos 24 de ensino médio que funcionam atualmente em tempo integral (das 7h às 17h), baseado num sistema de parcerias chamado de Dupla Escola pela Secretaria de Educação. O projeto, que atendia a dois mil alunos em 2012, chega a 2014 com 10 mil, um crescimento substancial, mas que ainda atinge apenas pouco mais de 1% do total de 900 mil estudantes matriculados.

 

O secretário Wilson Risolia alega que a transição para o modelo de horário ampliado leva tempo, mas acredita ser possível cumprir a meta de chegar à universalização em 2021. Por outro lado, as parcerias dividem opiniões e têm a resistência do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (Sepe), que considera que a iniciativa cria uma espécie de elite dentro da rede pública e pode levar a uma privatização do ensino.

 

– Nos últimos anos, percorremos o mundo, inclusive acompanhados por professores da rede, para entender as melhores práticas de educação. As avaliações que fizemos mostram que escolas comensino integrado, profissionalizante, e horário ampliado têm melhor desempenho. Buscamos então parceiros estratégicos, que podem ser de governos de outros países a empresas. E o projeto em geral está associado à vocação econômica da região onde implementamos. Todos ganham, já que o investimento vai resultar numa mão de obra mais qualificada – justifica Risolia, adiantando que para 2015 está prevista a criação de um colégio bilíngue de mandarim no programa Dupla Escola.

 

O modelo das parcerias começou a ter destaque em 2008, quando o prédio da estação telefônica da Oi, na Tijuca, passou a abrigar o Colégio Estadual José Leite Lopes, conhecido como Nave, sigla para Núcleo Avançado em Educação. Depois, vieram outras empresas, como o Grupo Pão de Açúcar, que introduziu no Colégio Comendador Valentim dos Santos Diniz, em São Gonçalo, um ensino integrado voltado para a formação de técnicos em leite e derivados e panificação. E, no fim do ano passado, o Instituto Ayrton Senna passou a cuidar da parte pedagógica de seis unidades. Basicamente, a iniciativa privada entra com apoio na parte de equipamentos e suporte para treinamentos, mas o estado continua sendo o responsável pelo pagamento dos profissionais e pela gestão da escola. Em 2012, último ano com resultados já divulgados do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), o Nave foi a unidade com melhor desempenho da rede estadual, e o Comendador Valentim dos Santos Diniz ficou em terceiro lugar.

 

Este ano, o Dupla Escola avançou do território das empresas e ONGs para o apoio de embaixadas de outros países, com o objetivo de criar colégios de ensino bilíngue. Em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, o Ciep Carlos Drummond de Andrade tem o suporte do Condado de Prince George, no estado de Maryland, para ensinar inglês. No Méier, a parceria é com o Ministério de Educação, Cultura e Esporte da Espanha, no Colégio João Cabral de Melo Neto. E em Niterói, a professora francesa Sonia Timizar coordena o trabalho que leva o idioma a cerca de cem alunos no Ciep Leonel Brizola.

 

– São 16 horas ao longo da semana com o ensino do francês. Mas não são somente as aulas da língua propriamente dita. Eu coordeno um ateliê científico com as experimentações em francês, onde o aluno precisa do idioma para poder participar – comenta Sonia, que fez o treinamento para o projeto na Academia de Créteil, que representa mais de 3 mil escolas e quatro universidades francesas.

 

Para poder conseguir uma vaga na unidade, os alunos tiveram que passar por um teste de seleção, o que acontece em 20 dos 24 colégios participantes do projeto Dupla Escola, e explica em parte o bom desempenho em avaliações como o Enem. Mas o modelo é alvo de crítica do coordenador do Sepe, Alex Trentino:

 

– A consequência é que são criadas escolas pretensamente de elite, melhores que as outras, com mais investimento, o que é exatamente o contrário do conceito de uma educação que deveria ser igual para todos. Brigamos para que se invista nas escolas que são mais carentes. E por mais que se diga que a iniciativa privada não faça a gestão da escola, sempre há interferência.

 

A coordenadora do Dupla Escola, Maria Aparecida Pombo Freitas, rebate:

 

– Das vagas que oferecemos, 90% são reservadas para alunos da própria rede pública. E o fato de haver um processo de seleção não deixa de ser uma preparação para o que aquele jovem vai encontrar mais à frente, em exames como o Enem.

 

Para João Batista Araújo e Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, voltado para a promoção de boas práticas em educação, as parcerias são bem-vindas, mas é preciso pensar em mudanças bem mais amplas e profundas no ensino médio:

 

– Nós temos um ensino desajustado para a realidade da educação, da economia, das pessoas… Se não houver mudanças mais amplas, iniciativas como a do Rio se tornam pequenas belezuras, que ficam restritas enquanto não cuidamos do essencial. E é preciso lembrar que política de tempo integral não é só plano de metas, tem que envolver todo um planejamento de longo prazo no orçamento.

 

(Ruben Berta/O Globo)

http://oglobo.globo.com/rio/estado-cria-24-escolas-de-ensino-medio-integrais-partir-de-parcerias-11659049

 

 

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