Lançado em 20 de novembro na Escola Nacional “Florestan Fernandes”, com palestra de Luiz Carlos de Freitas durante encontro de formadores da Via Campesina, o documento histórico inédito sobre a construção da Escola Única no período mais fértil da revolução soviética faz avançar o debate
sobre a educação brasileira
Por Cecília Luedemann
No prefácio dessa edição em russo, N. K. Krupskaya, do Comissariado Nacional da Educação da União Soviética, explica essa primeira da série de publicações da Seção Científico-Pedagógica, biblioteca da revista Caminhos para a nova escola: “A coletânea publicada, que descreve a vida da primeira Escola-Comuna experimental do Comissariado Nacional da Educação, reflete o enorme trabalho feito. Ela narra como a escola cresceu internamente e desenvolveu-se – percorre todo o caminho do seu desenvolvimento, momentos críticos, crises de crescimento, dificuldades que teve que superar”.
A publicação de A Escola-Comuna, coletânea de textos escrita por educadores que participaram da construção da Escola Única, organizada por Moisey M. Pistrak, é tão importante quanto a publicação de Poema Pedagógico, de Anton S. Makarenko, nos anos de 1980 no Brasil. No entanto, esse relato literário sobre a educação de uma nova geração de revolucionários na “Colônia Gorki” já era conhecido, nas traduções em espanhol, nos anos de 1950, diferente de A Escola-Comuna, publicado em 1924 em Moscou e nunca traduzido.
Além do precioso documento, a edição traz a pesquisa realizada por Freitas sobre a Pedagogia do Meio: “Não devemos perder de vista neste processo que uma pedagogia do meio é, antes de mais nada, uma pedagogia crítica de seu meio e que, portanto, forma sujeitos históricos (auto-organizados)”.
Embora A Escola-Comuna tenha demorado para chegar ao conhecimento do público brasileiro, a obra retoma o debate sobre a Escola Única justamente em uma dos momentos mais críticos da educação brasileira. A crise educacional aparece na mídia corporativa como um “mal”, mas nunca como as mazelas da escola capitalista ou como dívidas do Estado.
De acordo com censo do Ministério da Educação sobre a educação básica, em 2009, quatro em dez alunos não estão matriculados no ensino fundamental de nove anos. Além do acesso não estar garantido a todos, questiona-se a qualidade do ensino público. O dedo acusador dos governantes aponta os culpados: os professores, pelo mau preparo, e os alunos, pelo vandalismo.
A leitura de A Escola-Comuna nos mostra a construção de uma nova escola – totalmente oposta ao que conhecemos hoje no capitalismo – no período da guerra civil, de 1918-1923, depois da tomada do poder pelos trabalhadores. O livro está organizado em duas partes: a escola do trabalho do período de transição, escrito por Pistrak, e os relatos dos educadores sobre o trabalho com as disciplinas de Matemática, Ciências Naturais, História e Ciências Sociais, Ciências Econômicas, Literatura e Artes Plásticas. Aqui encontramos restabelecido o princípio da totalidade contra o da fragmentação. A escola é um todo, indivisível, dirigido sob o princípio do trabalho, escola que não separa a formação intelectual da criação manual e sob a direção coletiva de educadores e educandos, nem a participação dos estudantes nas lutas gerais da classe trabalhadora. Por isso a dedicatória dos autores aos alunos da escola experimental de Moscou: “Participantes invisíveis, indiretos, mas longe de serem os últimos na criação desta coletânea, devem-se considerar, com pleno direito, nossos camaradas mais novos – nossos mopshks – os estudantes da comuna escolar”.
Um livro raro, único, que não busca receitas, nem modelos. Ao contrário, revela a construção da nova escola socialista sob os dilemas históricos e lutas de posições políticas diante dos objetivos da educação. Uma experiência educacional dirigida por Pistrak dentre as 100 escolas experimentais que vivenciaram a construção de uma nova pedagogia para a escola única sob a direção de Lunatcharsky e Krupskaia, pela formação científica, cultural e política ampla e pela criação da autodireção. Pela defesa desses princípios revolucionários, os pedagogos Pistrak e Pinkevich foram fuzilados em 1937, pelo Estado estalinista, quando a reforma educacional retomou definitivamente a aula como centro da escola e a formação técnica como objetivo da industrialização soviética na tese do socialismo num só país.
Uma teoria presente nas experiências de formação pedagógica e política do Instituto Educacional “Josué de Castro” e pelas escolas itinerantes do MST. Um livro de referência para todos: educadores, educandos e trabalhadores comprometidos com a luta socialista.
Cecília Luedemann é jornalista, educadora e colaboradora da Editora Expressão Popular e do setor de educação do MST.
1 comentário
Esta obra é uma grande contribuição para a Educação brasileira. Um grande chamado para os pedagogos brasilerios.