22 de junho de 2010

Crise do ensino médio ameaça mão de obra

Mercado exige pessoas mais qualificadas, mas escolaridade média do jovem brasileiro está abaixo do necessário

Por Tatiana Duarte

 

  

São Paulo – Incapaz de colocar todos os seus adolescentes no ensino médio, o Brasil vive o risco de um verdadeiro “apagão” de mão de obra nos próximos anos, já que a conclusão do ensino médio, além de permitir ao aluno a entrada na faculdade, representa a possibilidade de acesso a melhores ofertas de emprego. Esta é uma das principais constatações de estudos feitos por vários especialistas e compilados em uma publicação lançada ontem em São Paulo, em parceria com o Movimento Todos Pela Educação e o Instituto Unibanco. De acordo com os dados apresentados, levantados pelo Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (Ipea), em 2008 havia mais oferta de emprego para quem tem mais escolaridade. A concentração das vagas estava nos trabalhadores com uma média de 11 anos de escolaridade. Hoje, no Brasil, são necessários 12 anos de estudo para completar toda a educação básica – o ensino fundamental mais o médio. No entanto, entre os jovens brasileiros de 18 a 24 anos, a média de escolaridade é de 9,1 anos de estudo.

  

Segundo Wanda Engel, superintendente do Instituto Unibanco, é preciso investir urgentemente nesta etapa de ensino. “O ensino médio é uma bomba-relógio prestes a explodir. Em algumas regiões do país já temos déficit de vagas para mão de obra qualificada. Se não mudarmos esta realidade, o país vai parar de crescer”, alertou.

 

Entre 1991 e 2004, o número de matrículas no ensino médio mais que dobrou no Brasil: passou de 3,8 milhões para 9,2 milhões. Porém, o Brasil está 28 anos atrasado em relação ao Chile no acesso à educação. O país sul-americano já universalizou o acesso ao ensino médio, de acordo com o pesquisador Ricardo Paes de Barros, do Ipea. “Hoje, o jovem chileno que entra no mercado de trabalho passou em média 12 anos na escola. Se continuarmos aumentando apenas um ano de estudo por década, vamos demorar mais 30 anos para chegar aonde o Chile está hoje”, ressaltou. Paes de Barros ainda alerta para a parcela de jovens com idade entre 15 e 17 anos que estão fora da escola. De acordo com ele, entre 2000 e 2008 o país não conseguiu atrair para os bancos escolares uma taxa média de 18% de jovens nesta faixa etária. O pesquisador concluiu também que a taxa de frequência no ensino médio sobe porque o Brasil ainda se esforça para corrigir o atraso escolar. “Quando o fluxo do ensino fundamental estiver corrigido, o ensino médio vai parar de crescer”, complementou.

 

Causas – A publicação faz um diagnóstico da situação do ensino médio brasileiro, mas não aponta causas ou soluções. Estas questões estão sendo analisadas em uma outra etapa de estudos, que serão divulgados em novembro deste ano. Para a superintendente do Unibanco, um dos problemas que já podem ser verificados é que faltam atrativos para o adolescente buscar a escola. “É um problema de concepção. O ensino médio não está servindo nem para colocar os jovens para o ensino superior, nem para a formação técnica, e muito menos para dar uma formação geral aos nossos jovens”, disse Wanda Engel.

 

Na opinião do diretor de Concepções e Orientações Curriculares para a Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), Carlos Artexes, a compreensão do fenômeno da crise do ensino médio não é linear e tem de se articular com outras etapas. “O ensino médio no Brasil, pelo próprio nome, que antes era chamado de ensino secundário, nunca teve caráter de prioridade”, disse. Para ele, a lei que exige a obrigatoriedade de frequência até os 17 anos de idade, a ser implantada até 2016, não mudará muita coisa se não houver adequação entre a proposta pedagógica do ensino médio com o plano de vida desses jovens. “Precisamos ouvi-los para saber o que pretendem, qual a escola que querem”, afirmou.

 

A repórter viajou a convite do Movimento Todos Pela Educação e do Instituto Unibanco

Texto originalment epublicado na Gazeta do Povo, em 17/06/2010 – Curitiba PR

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