Nas múltiplas amostras de trabalho veiculadas no blog Germinal – Educação e Trabalho e, especialmente, nos posts relacionados com o Programa de Desenvolvimento de Chefias e Supervisores: (4) Supervisores – Administração de Conflitos e Negociação; (3)Supervisão e Criatividade de Grupo; (2) O uso metodológico da arte na educação profissional e corporativa e (1) Desenvolvimento de Supervisores: o uso pedagógico da arte; temos procurado delinear os contornos de uma proposta educativa, que acreditamos original. Na falta de uma denominação melhor, vamos chamá-la de Aprendizagem Criativa.
A Aprendizagem Criativa, na forma como é posta em prática nos exemplos citados, aproveita-se da abordagem da Escola Nova, do Construtivismo e da chamada Pedagogia das Competências. Da Escola Nova, valoriza-se a atividade e o interesse do aprendiz e não a do professor ou instrutor. Do Construtivismo assume-se que o saber acumulado pela humanidade tem que ser reapropriado e resignificado por cada um e que todo conhecimento é uma construção pessoal e única. Da Pedagogia das Competências assume-se que competência só é desenvolvida ao se enfrentar os problemas e os desafios que a requeiram.
Essas referências, laços históricos com as abordagens contemporâneas, não esgotam as da Aprendizagem Criativa. É preciso adicionar o tempero e a liga da criatividade. Ora, é sabido que a criatividade é um traço humano fundamental. No entanto, a educação que sempre praticamos carece de criatividade. Se a repetição, o apego à permanência, não fosse uma outra característica humana fundamental, poderíamos dizer que nossa educação escolar padece de falta de humanidade. Entendendo, no humano, uma dialética entre permanência e transformação, só podemos afirmar que a nossa educação tem sido unilateral.
Quiçá por necessidade, comodidade, amarras estruturais ou imposição histórica de modos de produção, a escola sempre esteve do lado da permanência. Como conseqüência, a criatividade é uma flor rara e estranha nos espaços educativos formais. Na minha formação como educador e na minha prática educativa inicial, nunca a criatividade foi considerada como foco ou como centro de uma proposta educativa.
A transmissão do conhecimento; a mudança de comportamentos; a pedagogia crítica dos conteúdos; as teorias crítico-reprodutivistas; a apropriação do conhecimento humano acumulado; o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes, a operacionalização dos objetivos educacionais; mais avançadamente: a conscientização, a formação política, a educação para a cidadania e a liberdade estavam alternativamente no centro das preocupações e das discussões, fossem elas contra ou a favor. Nunca se falava em criatividade. Eu mesmo nunca tinha criado nada.
Para fazer um intervalo na leitura, o vídeo postado a seguir também fala disso de uma maneira leve e divertida.
Um dia, para a construção do Programa de Desenvolvimento de Chefias e Supervisores, comecei estudando o perfil do supervisor que era necessário para o momento e para o futuro. Para enfrentar uma crise estrutural e a transformação social e organizacional respondentes, ficou claro que a critividade seria cada vez mais necessária. Ser criativo é fundamental para participar, sendo sujeito, das mudanças cada vez mais rápidas e abrangentes da sociedade e das organizações de trabalho.
Para atender ao diagnóstico, precisava criar um programa de treinamento e desenvolvimento que tivesse a critividade como centro. Fui à busca de referências. Até que um dia deparei-me com um texto que classificava a Psicanálise Junguiana como uma psicologia da criatividade. Ora, uma psicologia da criatividade, como a de Jung, poderia auxiliar na busca de um método e no desenho de um programa centrado na critividade.
De fato, o método Junguiano, embora esteja voltado para a psicoterapia e para a criatividade individual (entendida como a criação de si mesmo), forneceu muitas pistas.
Carl Gustav Jung entendia a doença mental como resultante de uma obstrução do desenvolvimento em direção a uma atualização de si mesmo. Entendia também haver um relação compensatória entre consciente e inconsciente. Obstruído o desenvolvimento consciente, o inconsciente começa a criar problemas na operação cotidiana da vida e enviar mensagens ao consciente sobre sua situação de estagnação e sobre as formas de superação (criatividade psicológica).
Uma via régia para o envio de tais mensagens é o sonho. O veículo de transmissão é o símbolo. O símbolo é um conhecimento consciente em gestação. Diferentemente do conceito que é tão mais operacional quanto mais preciso, o símbolo foca um sentido e abre uma multiplicidade de significados. É necessário desvendá-lo.
A partir do sonho, veiculador de símbolos, Jung estimula a análise através de duas formas metodológicas alternativas ou complementares: a amplificação objetiva e a amplificação subjetiva.
Na amplificação objetiva, a análise é efetuada pela busca das inter-relações do símbolo em questão com a tradição simbólica da humanidade. Este específico motivo simbólico já surgiu na história da humanidade? Que interpretações foram construídas em seu redor? A partir daí, busca-se identificar o sentido do sonho e o significado do símbolo naquele determinado processo de desenvolvimento individual.
A segunda forma procura efetuar uma amplificação subjetiva do significado do símbolo. O paciente dança, pinta, elabora poemas, interpreta teatralmente, esculpe em torno do motivo simbólico, de forma a ramificar os seus significados. Ao esforço de compreensão o inconsciente responde com outros motivos simbólicos. Estabele-se um diálogo consciente/inconsciente orientado para a resolução do conflito que suscitou o estancamento do crescimento.
Em um processo não linear, mas em circulação, o significado do símbolo, como em um romance policial, é descoberto. A disposição psicológica muda. O crescimento, gradativamente desimpedido, retorna. A crise vai sendo superada. Uma nova realidade psicológica emerge.
Em próximo post, mostraremos como, a partir da psicologia da criatividade de Jung, construímos uma metodologia e desenhamos o Programa.
O texto anterior parte de um já publicado em Küller, José Antonio. Ritos de Passagem -Gerenciando Pessoas para a Qualidade. São Paulo, Editora SENAC, 1996.
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